quinta-feira, setembro 13, 2007

se artur é arturzinho, agosto será agostinho

o agostinho que deus tem - na picheleira acrescenta-se sempre* estas três palavras quando nos referimos a defuntos - era proprietário dum famoso estabelecimento comercial do ramo vinícula. era pois dono da taberna das portas largas.

dele recordo dois instantes:

o primeiro está relacionado com uma campanha que a pepsi em tempos promoveu que consistia em trazer no interior das caricas das garrafas de litro uma rodela plástica que servia para trocar gratuitamente por uma garrafa nova. ora o artur - outro que deus tem -, filho bexigoso do agostinho, lembrou-se de "arquivar" na
mais alta prateleira situada por detrás do balcão, umas garrafas "premiadas". na ausência do filho, e sem que o pai tivesse percebido a artimanha do filho em deslocalizar (sim, ó bic, este deslocalizar é uma provocação) para longe do lote de venda estas garrafas, eu fui lá um dia trocar, no espaço de duas horas, três garrafas. comprei uma, chegava a casa, tirava a rodela premiada e lá voltava à taberna. catita, hein?

o segundo instante estará relatado nos parágrafos seguintes.

quando o agostinho passou a pertencer ao grupo dos "que deus tem" o meu pai, pequeno industrial** do bairro, foi prestar a sua homenagem ao velho taberneiro, participando no velório realizado nas casas mortuárias da igreja de santa teresinha do menino jesus.

no fim-de-semana seguinte fomos passar uns dias à terra da minha mãe. a minha irmã que por lá vive, põe os acontecimentos do seu bairro natal em dia, inquirindo-nos acerca dos desenvolvimentos da picheleira.

à mesa:
- então, há novidades? nasceu alguém no bairro? morreu alguém?. perguntava ela.
- olha, o habitual, nada de novo. disse eu.
- bom, sabes, na verdade morreu o agostinho. interveio a minha mãe.

de repente, o meu pai que comia calmamente uma malga de sopa, revira a cabeça e os olhos, faz uma cara de muito espanto e exclama bem alto:
- o quê???????? (quem o conhece sabe bem como foi pronunciado este "o quê". sabe que é mais um "u quê-ê-ê") ai meus deus! não me digas! morreu???? o da taberna???? não me digas que morreu o agostinho!

tive que acalmar o homem:
- ó pai, não faça esse ar de espanto, porra! (quem me conhece, sabe também que eu não me atrevo a dizer porra ao meu pai. mas convenhamos que fica melhor aqui nesta frase) o pai foi ao velório do senhor!
- fui? ah pois fui, tens razão!

(quem conhece o meu pai, não se admira que ele faça estas coisas.

* bom, na verdade não sei se é sempre. o que eu sei é que o pires se referia sempre ao saudoso joão ferreira - também conhecido como o joão das alcatifas - como o joão ferreira que deus tem. e desde esse tremendo momento que em certos círculos se passou a acrescentar "que deus tem" ao nome dos defuntos: o antónio pires que deus tem, o mourão que deus tem, o mateus que deus tem, o ferraz que deus tem, etc... curiosamente, não sei se deus tem lá o meirim. nahh, deve ter, coitado do velho meirim e mais os seus lindos meninos!

** o meu pai sempre se referiu à sua profissão como: pequeno industrial. e isto faz-me recordar um colega que comigo tirou um curso de seguros, o amaral, que tem uma humildade do tamanho do mundo e que se referia sempre, mas sempre mesmo, à sua actividade profissional, como tendo um pequeno gabinete de contabilidade. nunca era um gabinete de contabilidade. era um pequeno gabinete de contabilidade. joinha!

2 comentários:

Gonçalves disse...

O velho Diniz é um espectáculo e essa do Pires em relação ao João Ferreira, é mesmo assim, é inesquecível.

Bic Laranja disse...

[Esta malta da Picheleira sempre teve a mania de implicar com os tiques dos outros.]
Abraço