quarta-feira, julho 02, 2008

o homem. o cigano

uns amigos que um dia passaram uma fim-de-semana comigo, no meio de umas mines e duns pianos (nalguns talhos ou restaurantes, chama-lhes teclados) grelhados, contavam-me da experiência que passaram durante os anos da faculdade "que agora não me ocorre o nome" mas que é aquela daquele prédio do carrilho da graça ao longo da segunda circular, lá para o pé daquela faculdade onde se anda quando queremos tirar o curso para sermos professores primários, estão a ver?

bom, contavam-me eles que não se admiram rigorosamente nada com o tom meloso e deprimente que certas e determinadas reportagens televisivas tem, na abordagem de problemas ou situações socio abarco antropológico quotidianas. continuam a ver a coisa?

adiante.

diziam eles que não se admiram porque a fornada de jornalistas que prolifera nas redacções das televisões nacionais é precisamente aquela que há uns anos frequentava a faculdade com eles. essa horda de actuais jornalistas tinha por denominador comum apresentar trabalhos de fim de curso quase sempre iguais: iam para o terminal do rossio ou para a saída dos barcos do terreiro do paço e com o movimento das pessoas como imagem principal, iniciavam a narração
com um tom de voz solene, em fundo, da seguinte forma: "o homem." e continuavam por ali fora.

entendo perfeitamente o que me estavam a dizer, compreendi então, que há poucas almas brilhantes que façam reportagens "de fundo" que não caiam na tentação e na tecla batida de apresentar os temas que nós todos já conhecemos: como viver com o ordenado mínimo; os últimos pastores da serra; ser deficiente em portugal; os estado dos tribunais em portugal; os novos imigrantes, etc.

ontem voltei a recordar-me disso porque a sic emitiu pela centésima vez uma reportagem sobre ciganos com aquele tom tão bonitinho de: tadinhos, sempre perseguidos, nómadas, dançam tão bem, ninguém os compreende e por aí fora.

e eu vejo três minutos e enjoo. agonia-me aquele caralhinho de se fazer dos ciganos um bando de coitadinhos. eu continuo à espera duma reportagem, feita no bairro da minha criação, por exemplo, em que mostrem, não aquela coisa do nomadismo, das tradições, e das palminhas flamencas, mas sim: os gamanços que nos fizeram; os tiros que alvejaram o meu prédio e acertaram no pescoço do meu tio; a impunidade que adquiriram nos estabelecimentos comerciais onde as criancinhas, coitadinhas, gamavam fruta à lá gardere; o vasqueiro que tínhamos de aturar "ól naite longue", o medo que tínhamos quando passávamos por certas zonas do bairro, etc.

não dão audiências estes temas? é mais bonito abordar a coisa pelo lado dos desgraçadinhos racialmente segregados, é? lamento, mas a verdade é bem mais distante que a que passa na televisão.

há dúvidas? não tenham.

eu vou com vocês, jornalistas de secretária, dar uma volta pelo passado do meu bairro e faço uma reportagem também. bem diferente.

na boa!

1 comentário:

RM disse...

Escola Superior de Comunicação Social. E que belas teclas tinha aquele piano...

Abraço, pá