quarta-feira, fevereiro 18, 2009

tirem-me daquiiiiiiii


há coisa de um par de anos, abanco, juntamente com a mais conceituada arquitecta de ascendência moçambique-britânica da sua geração (ficou um título bonito, não ficou?) num restaurante estilo "refeições rápidas", ali para os lados da infante santo.

ela lá pede, sei lá, não me recordo, mas deve ter sido um lombo de porco com arroz ou coisa parecida e eu, parvo, peço uma alheira:
- e pode ser com batata cozida e grelos?
- pois... nem temos grelos nem o restaurante usa batata cozida.
- pronto, paciência. dispenso o ovo estrelado (credo), venham as batatas fritas mas pelo menos conserve a pele da alheira, por favor. não me tira a pele à alheira, ok?
- fique descansado.
fiquei.

passam os minutos, vêm as bebidas, comem-se as manteiguinhas, come-se o paté, vem o lombo, pede-se outra bebida

- olhe e a alheira?
- já vem.
- ok.

bebe-se a bebida até ao fim, pede-se outra, depenica-se também no lombo, fala-se sobre obras, acaba-se a bebida, acaba-se o lombo

- não se esqueceu da alheira, não?
- não, não. não demora.

fica-se a li só a falar de obras, sempre com um olho sintonizado no simpático empregado de mesa, a fome aperta

- então e a minha alheira? mas passa-se alguma coisa?
- sabe, eu vou-lhe confessar. é que a minha colega já tentou fritar a alheira mas a pele rebenta sempre. e tenta de novo e volta a rebentar. já lá vão três alheiras estragadas.
- está a falar sério?
- estou, sim. confesso que estou.
- faça-me um favor. dirija-se à sua colega e peça-lhe, encarecidamente o seguinte: ela que bote a alheira numa sertã ou numa frigideira em lume baixinho, sem azeite nem nada. depois, vá virando a dita cuja, de 30 em 30 segundos. ali, sem pressas, com calma. acredite que em 5, 6 minutos ou coisa parecida a alheira está no ponto. e se rebentar a pele aqui ou ali, não tem mal nenhum.

dez minutos depois chegou a alheira. estava ok. comeu-se.

- sabe, o senhor não me leve a mal. mas é que nunca tínhamos servido alheira assim.
- não levo nada a mal. continuamos amigos.

ora isto é como se deve imaginar uma questão de gosto. à quem coma, por exemplo, pão a acompanhar pizza. há quem faça, como eu conheço, sandes de puré de batata. há também quem conheça que ateste a sua viatura ao mesmo tempo que fuma um cigarrinho mas isso já são outros trezentos.

agora vamos lá a ver uma coisa, estamos a falar de restaurantes. eu não exijo um cumprimento religioso de todas as tradições mas não se está à espera que haja alguém que solicite ao empregado lá do sushi do japonês, para dar uma grelhazinha no peixinho, pois não?. ninguém pede ao senhor dos frangos da guia para fazer o favor de o servir desossado, pois não? ninguém espera que a meia dose de caracóis venha servida com batata frita, pois não?

reparem, volto a repetir, eu não sou contra a forma que certas pessoas e certos restaurantes servem a comida, fico é fodido quando não me apresentam as refeições correctas. alheira sem pele e com batata-frita sim, mas se houver também a hipótese de a comer como deve ser: com pele, batata cozida e grelos.

estou a escrever isso e a recordar-me que isto alastra também à tasca mais moderna: a rulote. chego eu ao aeroporto numa galga dos diabos, estou ali a passar na marginal e aviso a minha maria «vou ali mandar abaixo uma bifana. fui. arrependi-me. foram servidas em panrico ou lá o que aquilo é. paneleirices!

segundo uma votação promovida pelo programa imagens de marca, o filme "tirem-me tudo" foi eleito o melhor anúncio de publicidade português dos últimos cinco anos. tudo bem nada a opôr. o texto lá do filme diz qualquer coisa como: tirem-me tudo, mas não me tirem o gosto. e agora reparem «... o gosto da alheira a rebentar de sabor ou o bacalhau com todos a nadar em azeite...»

agora adivinhem, num anúncio em que se eleva algumas das melhores coisas tradicionais portuguesas e não só, aparece - e fazem menção de reforçar com texto - um caralho duma alheira, sem pele e, imaginem, com um ovo estrelado.

que merda é esta?

qual foi o caralhinho do copy que idealizou esta parte deste filme e quem foi o ignóbil do director de marketing que disse «sim, senhor, vamos filmar!»?

alguém me sabe dizer?

2 comentários:

tcl disse...

hás-de dizer-me, se souberes, qual é o restaurante de Lisboa e arredores que serve alheiras com batatas cozidas e grelos que é para eu ir lá. eu até gosto de alheiras. então, se forem de caça, melhor ainda... mas nos restaurantes parece que querem à viva força aumentar-nos o castrol! sempre com batatas fritas e ovo estrelado... blhec!

Gonçalves disse...

Experimenta fazer no micro-ondas, fica sequinha.