quinta-feira, agosto 30, 2007

traseiras

às vezes tenho saudades dos guinchos que soltavam as cordas (ou os cabos) e as roldanas dos estendais de roupa das traseiras da minha casa.

há qualquer coisa de urbano naquele som. qualquer coisa de quotidiano, qualquer coisa que me remete para lisboa. há qualquer coisa de "bairro" naqueles barulhos agudos.

não sei, pá!. sei que aqui onde eu agora moro, nos subúrbios (nos "subúrbios dos arredores" como ouvi num programa daqueles que dão na tv à tarde) onde proliferam as marquises com estendais em plástico ou máquinas de secar a roupa, deixei de ouvir aquilo.

e tenho saudades.

tenho saudades de descer ao primeiro andar, bater à porta da dona engrácia e pedir autorização para me deixar saltar para o telhado do rés-do-chão - casa da minha tia zé - onde jaziam molas de roupa deixadas cair pela minha mãe.

mas aquele som agudo...

e depois não eram só os guinchos, era também o barulho surdo e grave das roldanas oleadas. ou mesmo mais tarde, quando as cordas foram substituídas por cabos. e mesmo esses cabos passaram a vir revestidos por mangueirinhas plásticas que não aleijavam as mãos.

um salto tecnológico bestial esses mangueirinhas que revestiam os cabos, pá. nem a roupa ficava com manchas de ferrugem, nem o corpo ganhava tétano das picadelas oriundas dos arames dos cabos que se desfaziam.

e sim, tenho saudades.

bem vistas as coisas, a passagem das molas de madeira para as de plástico também foi um salto tecnológico de registo. por outro lado, o sabor doce da madeira que sentíamos quando segurávamos as molas com a boca, passou a ser um sabor azedo e artificial do plástico (bhlah!).

tenho saudades.

há sons da nossa infância que deixam umas saudades do catano!

6 comentários:

ccunha disse...

E quando eu penso que neste blog já não pode aparecer mais nada que me surpreenda... eis que surge um post sobre as mangueirinhas de plástico que revestiam os cabos que substituíram as cordas dos velhos estendais da roupa... com uma breve referência à transição da utilização de molas de madeira para molas de plástico...
Eh pá, fenomenal!

tcl disse...

a mim, fizeste-me lembrar outros sons da minha infância. o homem que vinha a empurrar um carrinho com uma pedra que girava numa roda de bicicleta e que amolava facas e tesouras e consertava varinhas de guarda-chuva. quando começava a subir a rua do bairro fazia-se sempre anunciar com um apito especial, que fazia assim um som de passarinho e gritava: amoladooor, amoladoooor, amoladoooor.....
também havia este som, no teu bairro?

Anónimo disse...

Excelente...

Mais um post com a qualidade Pitx ;-P

Gonçalves disse...

No nosso bairro não eram só as roldanas dos entendais e os amoladores. Ó Diniz, tu ainda te lembras daquela bicicleta amarela e verde com uma cabine que tocava buzina a anunciar as farturas? Que saudades caraças. Já para não falar da clotilde das flores e da sô dôna pôna, a apregoar os caracóis.

Papoila disse...

Pá, não seja por isso! Eu peço à minha mãe para te ligar de cada vez que esriver a estender roupa, que aquela merda lá em casa ainda chia. Apesar das mangueirinhas de plástico.... Ah!, e também tenho molas de madeira!
Sério, é na boa! Aproveitas e ajudas a cota a dobrar os lençóis e a fazer os novelos de lã (sabes, não sabes?!

gnoveva disse...

genial. é tudo verdade.
na minha rua ainda há tudo isso. inclusivamente o amola tesouras.

nice.