o zé burrié - sobrinho do barbosa laranjeira, o maior caçador da picheleira - era um gajo que para os cânones dos anos oitenta tinha a chamada "classe de bairro": camisas aos quadrados, ar altivo, benfiquista roxo, ténis sanjo e cabelo aos caracóis tipo galrinho bento.
além destas coisas todas - e de outras impublicáveis - era um guarda-redes à moda antiga. a compor este ramalhete - lá está, também era um bom guarda-redes de hóquei não-patinado apesar de nunca ter tido a fama do excelso quelho - era ainda um filósofo da tanga com uma personalidade acutilante como raramente se via na picheleira.
certa tarde, uma daquelas quentíssimas que o mês de julho produz - estamos a falar de coisas estilo 42 graus, não me refiro a cenas mornas de 35 ou 36, ok? -, vínhamos todos ou da praia ou provavelmente da piscina da penha (deve ter sido da piscina, porque naquela altura não havia ordeca para grandes explorações.) quando na nossa rua, estava o referido zé burrié a dar toques numa chincha de borracha, ali sob a janela da ilda do macaco:
- então ó zé, não quiseste vir connosco?
- oh! quero lá saber disso!
- eh pá, mas com este calorão, sabe bem estar na água. amanhã vamos outra vez. vamos à do areeiro, bute?
- nah, não está tempo para isso. para mim, praia - ou mesmo piscina - é em agosto. para mim ainda não está tempo de praia. praia que é praia é em agosto.
e pronto, quando um gajo demonstra duma forma parva e ignóbil as suas convicções não há mais nada a fazer, não é?
lembro-me sempre do burrié em duas ou três situações. uma delas tenho-me lembrado por estes dias: foi preciso ter chegado a agosto para o calor desaparecer?
a outra, lembro-me amiude quando falamos sobre coisas com limites bem determinados. as alheiras, por exemplo. o meu pai é do concelho de mirandela. como devem imaginar, tenho acesso a alguns dos melhores exemplares desses enchidos. agora imaginem a cena, estou a comer uma valente alheira que alguém me trouxe não de mirandela mas dum concelho vizinho, valpaços por exemplo. e enceto o seguinte diálogo:
- esta alheira é bestial, não é?
- hum, nem por isso.
- não achas?
- quer dizer, não é bem... é de mirandela?
- não, é de lá ao pé, curiosamente é de valpaços.
- ahhhhhh, logo vi, é por isso. se fosse de mirandela era outra coisa.
ou seja, 20 ou 25 quilómetros já fazem uma diferença do caneco na qualidade da alheira.
balelas, digo-o eu!
esta cena repete-se com o leitão - se for da mealhada é uma coisa, se for quatro quilómetros acima é outra coisa - com a sardinha de peniche - se a comermos junto ao forte é uma coisa, se já for na praia da consolação é outra -, etc, etc..
paneleirices, digo eu!
além destas coisas todas - e de outras impublicáveis - era um guarda-redes à moda antiga. a compor este ramalhete - lá está, também era um bom guarda-redes de hóquei não-patinado apesar de nunca ter tido a fama do excelso quelho - era ainda um filósofo da tanga com uma personalidade acutilante como raramente se via na picheleira.
certa tarde, uma daquelas quentíssimas que o mês de julho produz - estamos a falar de coisas estilo 42 graus, não me refiro a cenas mornas de 35 ou 36, ok? -, vínhamos todos ou da praia ou provavelmente da piscina da penha (deve ter sido da piscina, porque naquela altura não havia ordeca para grandes explorações.) quando na nossa rua, estava o referido zé burrié a dar toques numa chincha de borracha, ali sob a janela da ilda do macaco:
- então ó zé, não quiseste vir connosco?
- oh! quero lá saber disso!
- eh pá, mas com este calorão, sabe bem estar na água. amanhã vamos outra vez. vamos à do areeiro, bute?
- nah, não está tempo para isso. para mim, praia - ou mesmo piscina - é em agosto. para mim ainda não está tempo de praia. praia que é praia é em agosto.
e pronto, quando um gajo demonstra duma forma parva e ignóbil as suas convicções não há mais nada a fazer, não é?
lembro-me sempre do burrié em duas ou três situações. uma delas tenho-me lembrado por estes dias: foi preciso ter chegado a agosto para o calor desaparecer?
a outra, lembro-me amiude quando falamos sobre coisas com limites bem determinados. as alheiras, por exemplo. o meu pai é do concelho de mirandela. como devem imaginar, tenho acesso a alguns dos melhores exemplares desses enchidos. agora imaginem a cena, estou a comer uma valente alheira que alguém me trouxe não de mirandela mas dum concelho vizinho, valpaços por exemplo. e enceto o seguinte diálogo:
- esta alheira é bestial, não é?
- hum, nem por isso.
- não achas?
- quer dizer, não é bem... é de mirandela?
- não, é de lá ao pé, curiosamente é de valpaços.
- ahhhhhh, logo vi, é por isso. se fosse de mirandela era outra coisa.
ou seja, 20 ou 25 quilómetros já fazem uma diferença do caneco na qualidade da alheira.
balelas, digo-o eu!
esta cena repete-se com o leitão - se for da mealhada é uma coisa, se for quatro quilómetros acima é outra coisa - com a sardinha de peniche - se a comermos junto ao forte é uma coisa, se já for na praia da consolação é outra -, etc, etc..
paneleirices, digo eu!
3 comentários:
Está bem esgalhado, isto.
Por acaso tens razão nessas "paneleirices".
Cumps
Esse gajo tinha uma maneira peculiar de andar, como quem traz meia-dúzia de ovos no sovaco e não os pode partir. Além do fiat 127 de performances imbatíveis a que o Nuno Pires respondia, "fia-te fia-te..."
1:42 PM
Ah! Ah! A descrição do Pedro é exactamente a maneira de andar do Zé. Bem visto.
Disse-me o mê irmão que o Zé tinha um cafezinho ali para Campo de Ourique. Cumpts.
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