o blog pipáterra, este mesmo que aqui se apresenta, tem o orgulho, a pompa e a determinação de, num acto de coragem - e profunda e solene humildade - apresentar ao povo e explicar às crianças, o ensaio discográfico:
"subsídios para a compreensão do medley do cantante el chato"
notas introdutórias: este magnífico momento musical, foi, durante a noite negra da ditadura cigana na picheleira (décadas de 70, 80, 90 do século xx e, provavelmente, o primeiro lustro do século xxi), o hino daquele pequeno enclave lisboeta.
não digo no hastear da bandeira, mas desde o romper da bela aurora, até aos momentos, já madrugada dentro, em que o crepitar da lenha se deixava de sentir nas pequenas fogueiras que eram acendidas pelos povos de tez morena dominantes, eram estes sons musicais, presença assídua (mas não pontual) no bate palmas diários.
o povo dominado - os senhores, como designavam os ciganos ditatoriais -, acabaram, aos poucos por assimilar aquelas pequenas canções que funcionaram como bíblia para o povo apátrida, levando-as para os bailes de carnaval das agremiações locais.
siga então o baile (é neste momento então que pressionam o botãozinho do toca - play no original. é aquele triângulo piquerrucho)!
- 00:05 o primeiro convite à dança. o cantante pergunta se há ali na roda, pessoal com disposição para dançar com ele. o povo diz que sim e manifesta-o com variados sins.
- 00:12 a proposta: então eu conto até quatro e vocês seguem, combinado?
- 00:17 cornetas, olés e mais cornetas e inicia a mensagem de beleza. o cantante alude nas suas palavras a uma catraia, possuidora duma beleza manifestamente aprazível.
a música decorre. várias estrofes se vão desenrolando sempre aceleradas por diversos olés e palminhas por anónimos inflamadores.
- 01:39 assobios vários, daqueles efectuados com a língua do executante a ser pressionada pelo lábio inferior.
- 02:00 primeiro momento transitório: o cantador abandona as descrições de beleza da pequena e parte para um relatório patológico dos efeitos da presença da referida beleza da personagem feminina na sua alma. diz que se encontra num estado de loucura por querê-la e por vê-la ali nos arredores do seu campo visual.
- 02:33 novamente as cornetas, novamente o enleio melódico que nos embala naquele carrossel de emoções
- 03:10 secção de palminhas rápidas dando início ao apelativo tema do canto. diz que só cantará a sua vida, canto esse que será efectuado ao longo do seu caminho, da sua estrada, da sua luta.
- 04:00 o cantante faz um chamamento ao povo para que grite ohohohs responsoriais após cada lema.
- 04:14 inicia-se aqui a segunda subida extasial até ao primeiro pico, com o povo a dividir-se, encontrando-se uma parte a incitar a outra a responder «cantarei» às palavras «somente, somente...»
- 04:20 a corneta faz disparar os corações. o povo está ao rubro.
- 04:36 as mãos estão no ar, os olhos projectam-se para o céu estrelado e as vozes reclamam «oyehh, ó vale, vale. o yehh ó vale vale». e aqui as versões dividem-se: uns que afirmam que é um cântico dedicado ao seu messias vermelho j. vale az., um conhecido cigano doutro enclave lisboeta, outros que reclamam não ser mais que uma má interpretação da frase «ó-i-é ó baré, baré o-i-é» ou seja, todos ao bar pedir uma mini e um coirato bem passado. algo copiado da liturgia católica, uma espécie de ritual das oblatas.
- 05:22 alguém, desesperado, diz: «senhora, senhora». será alguma ligação a fátima?
- 05:38 musicól de piano e cornetas raivosas.
- 06:10 quebra o acompanhamento. há mudança de instrumentistas. continua o batuque. sente-se o suór no ar. as camisas de seda estão encharcadas.
- 06:22 alguém diz que o vai rachar. alguém responde «está rachado». como quem diz «missão cumprida. roger and out. o batuque não pára. há mistério no ar. o que virá a seguir?
- 06:40 desvanesse-se o mistério, a guitarra faz-se ouvir. e fala-se em palma. quererão que o povo bata palmas? não vejo que algo diferente possa ser.
- 07:10 nova flexão: o cantador distribui garotas (chicas) - será um proxeneta? - para auxiliar os presentes a continuarem eufóricos: chica chica para bailar, chica, chica para gozar. sem comentários, as palavras estão lá. entretanto, para somar ao que refiro aqui, há mais cornetas e ouvem-se distintivamente assobios piropiais: fuiii-fuiu!
- 07:38 porompompero - sem palavras. é o domínio.
- 08:35 uá-uás feitos em órgão, provavelmente de igreja - influências do método vitorino matono. dando início ao cântico final de adoração ao sol que vai nascer. palminhas até ao silêncio.
5 comentários:
AHHHHHHHHHHHHHHHH!
Post do caraças Pitx! Inspiração divina!
O povo e as crianças ficaram infinitamente mais cultos.
Que delícia, que delícia.
Adoro quando fazes estas coisas!
:-))))))))))))))
Começar o dia a rir é do melhor.
Um dia destes vais malhar com os costados no Inferno! (em ameaça mode)
beijo d'enxofre
ahahahahahah
Estragaste tudo, Pitx ;-P
"noite negra da ditadura cigana na picheleira" ???
ahahahahahaha
sabes que te arriscas a uma naifada, não sabes?
enxofre
Ai, pá, não sei como me escapou este post! Os meus pais tinham isto numa cassete e eu fartava-me de ouvir. Tinha uns 12 ou 13 anos :D
Mas prontoSSS, depois de ler isto nunca mais o poderei ouvir da mesma maneira.
(tu não existes, pá!)
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