terça-feira, junho 17, 2008

C3H5(NO3)3

a ideia que me vem imediatamente à memória é que a coisa é idêntica a uma daquelas cenas daqueles filmes de suspense em que há necessidade de se transportar uma instável carga de nitroglicerina dum local para o outro, no meio dum incêndio, através duma tábua estreitinha colocada sobre um abismo de, sei lá, uns bons 76 metros.

a qualquer momento, bum! e lá vai meia população da cidade para o maneta.

é esta a ideia que me assalta a alma nuns quantos momentos do quotidiano da minha filha: quando acorda, quando a vestimos, na despedida, no trajecto para a escola, da despedida na escola, por altura do banho, ao jantar e ao deitar.

as coisas são sempre feitas com a maior das delicadezas, com pinças, com medo de fazer desencadear a reação química. ao menor descuido, pronto, está o caldo entornado.

ela acorda e a coisa tem de ser com calma, o estore tem de ter sido puxado um tiquinho para cima durante a noite para que não haja brusquidão da luz a entrar no quarto. por vezes lá me esqueço e bum!, gritaria durante os processos seguintes.

depois é a passagem para o nosso quarto, para que se faça a cama dela e tal, «queres já o xixi?» em voz bem baixinha para não desaustinar o sistema. por vezes a táctica passa por colocar o volume da televisão do quarto, estrategicamente sintonizada no segundo canal para que ela se levante sozinha e decida ir ver, de que desenhos animados fazem parte aquelas vozes infantis.

a cerelac é outra etapa. ou é ela sozinha que come, ou a damos nós para despachar a coisa. nunca pode perceber que a decisão de ser a mãe ou o pai a dar-lhe a a pápa para acelerar o processo partiu de nós em vez de ela «hoje é a mããããããããeeeeeeee a dar!», «não és tuuuuuu, sou eu sozinhaaaaaaaaaa!». um «mas, ó filha, come que temos de ir embora para a escola», pode provocar um «mas eu não queeeeeeeero ir para a escolaaaaaaaaa!» e pronto, o atraso acaba por ser logo maior.

a lavagem dos dentes é uma aventura. o vestir, idem idem. a saída e a despedida da mãe é que já é outra loiça: ou porque quer levar o seu filhote jorge eimado (amado, no original), ou porque quer levar as polys, ou porque quer levar rebuçados para todos os seus amigos, ou porque decidiu ir de galochas mesmo estando calor, ou porque quer ir ao colo da mãe até ao carro....

e lá partimos.

tenho sempre o cuidado de nem lhe tocar durante a viagem, não vá o bicho espantar-se. nunca se sabe. vou caladinho e de rádio desligado. ah pois é!

à noite a mesma coisa: ou quer o banho na boa, ou quer ficar no rilécs da banheira, ou porque quer dar banho a metade da população do toys 'r' us ou porque quer, simplesmente, pintar as unhas antes de tomar banho. isto já para não falar quando não quer mesmo!

e o jantar é outro que tanto: «quero sentar-me hoje ali», «quero que o pai me ajude a cortar a carnucha», «quero uma palhinha, eu é que escolho a cor».

tudo, mas tudo mesmo é feito com cuidadinho. assim com nano-ferramentas, material do mais caro e importado de outro continente qualquer.

«quero dormir com as polys», «hoje contas-me a história do senhor fortunato», «pai, vem fazer-me carinhos e cócegas, vens?». o deitar é a mesma coisa: evitar sempre explodir a bomba. é sempre melhor evitar do que reparar danos. sempre!

hoje, já a caminho da escola e depois dum acordar, vestir, lavar, comer, etc... bem sucedido, lembrou-se que:
- quero as cartas da barbie!
puta que pariu, foda-se! e agora? lá caiu a peça do dominó que vai mandar todas as outras abaixo!
- ó filha, deixa lá, levas amanhã...
- mas eu quero hojeeeeeeeee!
- (silêncio)
- eu quero hojeeeeeeeee! (com berros mais altos)
- (silêncio)
- eu queeerrrrrr (com baba e ranho a salpicarem-me o tábliê, devidamente lavado e polido na sexta-feira passada)

e a cabeça ali a balançar entre um «deixa-te de merdas, volta atrás e vai lá buscar as cartas e ela cala-se logo» e um «sabes no que te estás a meter se lá fores buscar as cartas, não sabes?»

- cuca, cala-te duma vez por todas! não há cartas para ninguém! hoje não volto atrás. quando quiseres trazeres coisas, pegas tudo duma só vez....
- buááááááááááá, feio, bruxa, feio, eu quero a mãããããe!...
- (silêncio)

e depois na escola a choradeira habitual. e eu a colocá-la no chão e ela a fugir-se em direcção à porta. e eu a entregá-la à educadora e ela a espernear e a não largar o meu colo. e a baba a fixar-se nos meus ombros e «eu queeeeeeeeeeero as cartaaaaaaaaaaassss» seguido de muitos «eu odeio o meeeeeeeu paaaaaaai».

e eu a fugir dali sem perceber porque raio eles não nascem com um botão de ri sete ou pelo menos com um f5. pronto, um clrscr, já não peço tudo, caramba!

29 comentários:

Karla disse...

A mim às vezes bastava-me o controlo do volume... :P

Xana disse...

AHAHAHAHAHHAHAHAHAHHAHAHAHAHAHAH!

:)

Ai pá, muito bom!

Gonçalves disse...

A sério? É mesmo assim? Não deu para ver naqueles três dias. A partir de hoje não me queixo mais dos meus, xiça!
Acho que ela tá a precisar de uma terapia cá em casa.
Abraço

anne disse...

loooooooooooooooooooooooool

é que é mesmo assim...

Ana Rute Oliveira Cavaco disse...

lol.

Anónimo disse...

solidária, solidária...

olha, a minha já fez 5 anos. os terramotos são tremendos ainda (acrescidos dos ciúmes e comparações com a irmã), mas agora há muitos amuos (dos silenciosos) e retiradas para o quarto ou para o carro (o que dá muito jeito, diga-se) e cruzares de braços e trombas feias como tudo - mas eu aprecio mais assim.

tcl disse...

isso é mas é mimo a mais...

LP disse...

Fantástico!

Eu às vezes gostava era de ter um "undo".

Diabba disse...

Não a queres mandar estagiar uma semana no inferno?

"eu odeioooo o meu pai" ? E umas nalgadas, não?

Tb tenho uma diabbita-mimela de 4 anos, mas há coisas que não são mesmo admitidas na caverna, e ela sabe disso.

beijo d'enxofre

Anónimo disse...

Ahahahahahahah


O botão StandBy não te faz jeito???

Raquel disse...

De chorar a rir!!!!

Umbigo disse...

ahahahaahaha
hilário!

Anónimo disse...

Posso dizer que tenho 3 rapazes (8, 6 e 1 ano) e nunca nenhum me fez uma cena dessas... nem há cá cerimónias para os meninos não explodirem! Cuidado, não esteja a criar um monstro!! :)

cereja disse...

Excelente este post também (o também é porque vim cá quando escreveste o Sacrifícios).
Eu trabalho um pouco na área da educação e vou aproveitar coisas que aqui dizes que são exemplares.
Muito bem!

Cláudia disse...

Olha, amigo, eu para essas cenas (sobretudo para o do meio... ai o do meio...) uso Vicks First Defense (http://www.youtube.com/watch?v=sUU1Rsyn6VM).
Aconselho vivamente!
(lol)

Anónimo disse...

Tanto se evita reparar os danos que repará-los aos 15 ou aos 20 anos vai ser uma festa! Que é que vai fazer quando ela quiser que o namorado durma em casa? Dizer-lhe que não? Mas e se ela chorar?

CGM disse...

Ui! Medo!

Cá em casa também é assim, ando com pezinhos de lã com medo deles...

;) e bater-lhes?! Nunca na vida :p

Anónimo disse...

Titúlo da "estória" : Como criar um pequeno tirano...
ao fim das 3 primeiras linhas já me dava vontade de espancar o piqueno monstro...

Anónimo disse...

http://controversamaresia.blogs.sapo.pt/

Anónimo disse...

continua assim que vais longe. com tanto pé de lã o monstrinho está a criar asas para te fazer a vida num inferno. não sei se vais a tempo de o parar. que tristeza. e ainda se publicam merdas destas.

CGM disse...

http://pt.wikipedia.org/wiki/Ironia

Ironia
do Lat. ironia < Gr. eironía
s. f.,figura de retórica que exprime o contrário do que as palavras significam e que serve para depreciar ou engrandecer.

ironia
nome feminino
1. forma de humor que consiste em dizer o contrário daquilo que se pretende dar a entender
2. uso de palavra ou expressão em sentido oposto àquele que se deveria usar para definir algo
3. figura de estilo que veicula um significado contrário daquele que deriva da interpretação literal do enunciado (ex.: bonito serviço!)
4. sarcasmo, zombaria
(Do gr. eironeía, «interrogação», pelo lat. ironía-, «ironia»)

cereja disse...

OK, a «mãe da malta» disse o que eu vinha acrescentar depois de me chamarem a atenção para o post da Maresia. É daquelas coisas, ou se entende o humor ou não, e pronto!
Já agora, quando eu escrevi que aquilo que dizes são coisas exemplares, obviamente que não queria dizer no sentido de «servirem de exemplo» para os outros pais copiarem, se disse que até ia aproveitar o teu escrito, era - como pensei nem sequer ser necessário explicar - para pelo contrário se ver o desabafo de um pai ultrapassado pelas sucessivas cedências que funcionam como dizes 'em dominó'.
Há um livro bastante engraçado chamado «L'enfant, chef de la famille» de Daniel Marcelli que sugiro a leitura.

Anónimo disse...

As crianças não têm culpa.
Os pais é que deviam levar um bom puxão de orelhas.
coitados dos miúdos...a vida vai ensinar-lhes o quanto doloroso vai ser para eles aprenderem que o mundo não gira á volta do umbigo deles.
continue assim ó pai...vai longe e a miúda também

cs disse...

um castigozinho, tipo " a menina fica de castigo sentada no corredor 2 minutos e se voltar a fazer isso fica 3 minutos e se chorar não sai daí" garanto-vos que tem efeitos milagrosos.

Acho até que isto é cientifico.Até aos 3/4 anos as teorias behavioristas são excelentes ...

josé palmeiro disse...

Fartei-me de rir!!!
Mas, é bom saber que "quanto mais chorar, menos mija!"

Anónimo disse...

agora, sim, a 'mãe da malta' esclareceu, se bem que perde a graça -o sujeito do post é o humor do pai(a criança, obviamente,está ali como figurante)

Raquel Henriques disse...

Compreendo, compreendo, compreendo... há fases do arco da velha... poças!

Anónimo disse...

Tive um gato que era assim. Acabei por dá-lo. Como nao se pode fazer o mesmo com as criancinhas, sugiro que comecem a educar a menina. Nao gostaria de pensar que os novos pais estao a criar pessoas que nao conseguirao sobreviver no mundo lá fora. Esse está cheio de "naos". Convém que ela se comece a habituar já.

AnaBond disse...

tou como a karla... bastava-me um botãozinho de baixar o volume.

(ai ai... eu que tenho dois, a segunda é isto. o primeiro não tem nada a ver. é giro ver as pessoas que têm a mania que tudo sabem)