são as pessoas que fazem as empresas. esta frase que deveria ser paliciana, infelizmente, nos dias actuais, há um cada vez maior número de pessoas que tentam provar que não é bem assim. eu acho que o é.
um clube, porém, nem sempre é feito pelos seus adeptos. nalguns casos, infelizmente, digo eu.
ali no natal do ano passado, há coisa de dois mesitos, morreu um irmão da minha mãe. para quem percebe desta coisas dos relacionamentos, facilmente depreende que era meu tio.
era um tio especial. aliás, não era um tio especial, era uma pessoa especial. o facto de ter emigrado muito cedo, fez com que apenas o tivesse conhecido, sei lá, se calhar quando eu já tinha mais de 10 anos, p'raí, praí.
recordo como se fosse hoje esse dia. a chegada do aeroporto, a alegria por rever as suas irmãs, os seus cunhados, a alegria, principalmente, a alegria.
pessoas há que me apontam como tendo herdado alguma coisa dele. pois, não tenho a veleidade de admitir isso. tenho porém a certeza que já o tentei imitar aqui ou ali, infelizmente, sem o "sucesso" expectável.
uma das coisas que o caracterizava era o facto de ser uma pessoa de «histórias». ora, uma pessoa com histórias tem sempre salvaguardada a eternidade. (ok, pronto, uma eternidade de uma ou duas dúzias de anos). mas é admirável a quantidade de pessoas que ele «tocou» e que acrescentam ao «és sobrinho dele?» um «sabes, vou contar-te uma coisa que se passou com ele....» e isso, parecendo que não, é um dos meus sais da vida. o meu tio era desses.
no dia 25 de maio de 1946, há mais de sessenta anos, ele, juntamente com o seu amigo luís rodrigues, pegaram nuns cobertores que surriparam de suas casas e meteram-se à estrada desde a aldeia de vila nova do ceira, onde moravam, a caminho de coimbra. a ideia, era irem ver o seu sporting, na tarde do dia seguinte, jogar contra a académica.
quem conhece a zona sabe que, mesmo no verão eu, que nem sou dos mais friorentos, durmo de ederdon sobre belo do lençol. gostava que imaginassem, pois, o que significava para estes dois mancebos, meterem-se à estrada - são cerca de 35 quilómetros, ok? - durante a noite, um barbeiro do caneco, para irem à bola.
gostava ainda que entendessem que nos anos quarenta não havia esta coisa da televisão e coisa e tal. o jornal a bola, na certa, não seria leitura habitual, e por isso, os jogadores de futebol seria, com certeza, uns heróis sobrenaturais, para este dois jovens.
rezam as crónicas que já tinham andado um bom bocado, estavam completamente derrotados, quando, já na estrada da beira, viram a placa de indicava «coimbra - 25 quilómetros». eh pá.... o instinto é matreiro e a tentação foi regressarem para a caminha. mas a dedicação ao clube era uma força maior e por isso continuaram.
sabe-se que chegaram a coimbra pelas 6 da manhã pois foi a essa hora que tocou a alvorada do quartel de santa clara.
completamente estafados, ainda tiveram que atravessar a cidade até ao loreto, local onde se ia realizar o jogo. quando lá chegaram, encontraram dois conterrâneos, estudantes de direito, que ao saberem da façanha dos dois rapazes, não só os meteram lá dentro à borlú como ainda lhes deram uns carcanhóis para regressarem de comboio*.
recordo ainda com saudade dois ou três acontecimentos relacionados com esse jogo que o meu tio relatava com emoção: o facto de o bentes ter metido três ao grande azevedo, a alegria de ter podido festejar cinco golos do seu sporting, um deles do seu albano e, já um pouco à margem deste jogo, a forma como o meu tio enunciava a equipa belenense que venceu nesse ano o campeonato: capela, vasco, feliciano e serafim; mário gomes, quaresma, rafael...
tenho a certeza que hoje, deve estar lá em cima, feliz da vida - mas crítico, como sempre - de copo de cuca fresquinha na mão a mandar abaixo uns canecos em honra do seu leão.
estás, não está?
* há versões que indicam que os bilhetes para a viagem de regresso foram conseguidos pelo pecúlio conseguido na venda dos cobertores. eu não sei qual é a versão verdadeira. nestes casos, quando o mito tem mais piada que a verdade, lutemos pelo mito. para mim, venderam os cobertores e mainada!
um clube, porém, nem sempre é feito pelos seus adeptos. nalguns casos, infelizmente, digo eu.
ali no natal do ano passado, há coisa de dois mesitos, morreu um irmão da minha mãe. para quem percebe desta coisas dos relacionamentos, facilmente depreende que era meu tio.
era um tio especial. aliás, não era um tio especial, era uma pessoa especial. o facto de ter emigrado muito cedo, fez com que apenas o tivesse conhecido, sei lá, se calhar quando eu já tinha mais de 10 anos, p'raí, praí.
recordo como se fosse hoje esse dia. a chegada do aeroporto, a alegria por rever as suas irmãs, os seus cunhados, a alegria, principalmente, a alegria.
pessoas há que me apontam como tendo herdado alguma coisa dele. pois, não tenho a veleidade de admitir isso. tenho porém a certeza que já o tentei imitar aqui ou ali, infelizmente, sem o "sucesso" expectável.
uma das coisas que o caracterizava era o facto de ser uma pessoa de «histórias». ora, uma pessoa com histórias tem sempre salvaguardada a eternidade. (ok, pronto, uma eternidade de uma ou duas dúzias de anos). mas é admirável a quantidade de pessoas que ele «tocou» e que acrescentam ao «és sobrinho dele?» um «sabes, vou contar-te uma coisa que se passou com ele....» e isso, parecendo que não, é um dos meus sais da vida. o meu tio era desses.
no dia 25 de maio de 1946, há mais de sessenta anos, ele, juntamente com o seu amigo luís rodrigues, pegaram nuns cobertores que surriparam de suas casas e meteram-se à estrada desde a aldeia de vila nova do ceira, onde moravam, a caminho de coimbra. a ideia, era irem ver o seu sporting, na tarde do dia seguinte, jogar contra a académica.
quem conhece a zona sabe que, mesmo no verão eu, que nem sou dos mais friorentos, durmo de ederdon sobre belo do lençol. gostava que imaginassem, pois, o que significava para estes dois mancebos, meterem-se à estrada - são cerca de 35 quilómetros, ok? - durante a noite, um barbeiro do caneco, para irem à bola.
gostava ainda que entendessem que nos anos quarenta não havia esta coisa da televisão e coisa e tal. o jornal a bola, na certa, não seria leitura habitual, e por isso, os jogadores de futebol seria, com certeza, uns heróis sobrenaturais, para este dois jovens.
rezam as crónicas que já tinham andado um bom bocado, estavam completamente derrotados, quando, já na estrada da beira, viram a placa de indicava «coimbra - 25 quilómetros». eh pá.... o instinto é matreiro e a tentação foi regressarem para a caminha. mas a dedicação ao clube era uma força maior e por isso continuaram.
sabe-se que chegaram a coimbra pelas 6 da manhã pois foi a essa hora que tocou a alvorada do quartel de santa clara.
completamente estafados, ainda tiveram que atravessar a cidade até ao loreto, local onde se ia realizar o jogo. quando lá chegaram, encontraram dois conterrâneos, estudantes de direito, que ao saberem da façanha dos dois rapazes, não só os meteram lá dentro à borlú como ainda lhes deram uns carcanhóis para regressarem de comboio*.
recordo ainda com saudade dois ou três acontecimentos relacionados com esse jogo que o meu tio relatava com emoção: o facto de o bentes ter metido três ao grande azevedo, a alegria de ter podido festejar cinco golos do seu sporting, um deles do seu albano e, já um pouco à margem deste jogo, a forma como o meu tio enunciava a equipa belenense que venceu nesse ano o campeonato: capela, vasco, feliciano e serafim; mário gomes, quaresma, rafael...
tenho a certeza que hoje, deve estar lá em cima, feliz da vida - mas crítico, como sempre - de copo de cuca fresquinha na mão a mandar abaixo uns canecos em honra do seu leão.
estás, não está?
* há versões que indicam que os bilhetes para a viagem de regresso foram conseguidos pelo pecúlio conseguido na venda dos cobertores. eu não sei qual é a versão verdadeira. nestes casos, quando o mito tem mais piada que a verdade, lutemos pelo mito. para mim, venderam os cobertores e mainada!
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