quinta-feira, junho 28, 2007

'tás m'a dar baile, não?

a última coisa que eu esperava encontrar hoje, em frente ao meu local de trabalho, era um casal de turistas. velhotes, mapa na mão, vinham seguramente da estação dos combóios e embicaram para o lado errado.

chegam-se à minha beira e perguntam-me uma coisa estranha. ou melhor, não sei se era estranha mas parecia-me ser em lingua francesa. eu quero acreditar que o senhor me perguntou se a praia era para estes lados. eu, prudente até ao tutano, defendi-me retorquindo:
- tás m'a dar baile, não?
pelos vistos não estava.

riram-se muito. ambos.

lá apontaram para o pedaço azul no mapa. como quis acreditar que não queriam ir para o bugio ou para as berlengas, lá lhes apontei o caminho para a praia da poça. agradeceram a ajuda e a velhota deu-me um bacalhau. não tinham sandálias e não usavam meias. acabei por gostar deles.

odeio a língua francesa. odeio porque não a conheço. nunca tive na escola. não gosto da sua sonoridade. não sou capaz de dizer muitas coisas em francês. sei contar se for de seguida. salteado já não sei. se me perguntarem como se diz seis, tenho de contar de um até seis e mesmo assim, tenho a certeza que pronunciarei mal a palavra. acho que a única coisa francesa que digo com agrado é, talvez, jacques laffite. e sinto na espinha um mal estar permanente, quando ouço as palavras: platini, giresse, prost, pironi, tigana, batts, rocheteau, stopyra, battiston, tambay, arnoux, etc. vocês percebem isto, não percebem?

um dia a minha mulher levou-me a paris para me exorcizar esta malapata que tenho com a frança em geral - quem assitiu aqueles 3-2 de 1984, em marselha sabe do que estou a falar. tudo bem, limpei um bocadinho a alma. quem é que não limpa depois de passar 3 horas na gare d'orsay? quem é que não acha piada aquelas coisas que o garnier desenhou para as pessoas irem ouvir cantar ópera, quem é que não fica feliz depois de estar uns minutos sentado num sofá, dentro duma casa le corbusier? ninguém né?

ainda assim, a língua arrepia-me.

em paris, na casa onde dormia, falava-se português, mas isso não vale. na rua, era a minha mulher que sempre falava.
no espaço duma semana, nunca estive tanto tempo calado:
- ó môor, diz aí ao gajo para me trazer água.
- olha, diz à senhora que isto precisa de sal.
- pede lá a conta aos senhores.
- não te chibes aos gajos que roubei este livro.
etc..

é por isso que no meio daqueles milhões de pessoas que falavam francês, é no meio daquele inferno que ali, nas redondezas do hôtel de ville, mais coisa menos coisa dadonde o doisneau captou o chocho do casalinho, estou a entrar numa pastelaria e dou passagem a um chavalo:
- passa, companheiro, passa!
- oi?
- oi?
- ocês são dji portugau?
- claro!
- qui maravilha. muito prazer.
- como é que te chamas?
- carlito.

nem queiram saber a alegria que me deu ouvir aquele português dos trópicos no meio daquele frio parisiense. inté fiquei com vontade de lhe dar um abraço. e dei!

3 comentários:

Morena disse...

Do que te foste lembrar. Eu nunca mais pensei no carlito! na verdade se me tivesses perguntado nem sequer te saberia dizer o nome dele...
Já me ri muito a recordar esse encontro. bj

anne disse...

a velhota deu-lhe um bacalhau??
bacalhau aí em baixo é a mesma coisa que aqui em cima??

Anónimo disse...

Bacalhau...
Tá fixe... ;-P